A QUESTÃO DO CONHECIMENTO NA OBRA ENTE E ESSÊNCIA DE SANTO TOMÁS DE AQUINO

Felipe Olsen Fernandes[1]


Resumo: Segundo o pensamento aristotélico que fundamenta o pensamento de São Tomás de Aquino, deve-se partir das coisas compostas para chegar às coisas simples. O homem deve ficar atento ao seu redor para poder abstrair tudo e apreender o essencial das coisas para assim elevá-las ao seu intelecto. A participação da razão no ser depende de um ente fora da razão para ser estimulada. Na razão indutiva e dedutiva o homem esquece que muitas das coisas que estão na razão é abstração da mente Têm-se dois modos de adquirir o conhecimento que são sensível e intelectivo. A noção do conhecimento é muito importante, pois cada ser humano tem em si o ato e a vontade de conhecer.
Palavras-chave: Tomás de Aquino, Ente e Essência, Razão, Conhecimento, Intelecto.
  
Introdução

Santo Tomás de Aquino (1227-1274) foi um importante teólogo, filósofo e padre da ordem dominicana do séc XIII. É considerado um dos principais representantes da escolástica e foi influenciado pela filosofia greco-latina clássica, principalmente de Aristóteles.
Nasceu na cidade de Roccasecca - Itália em 1225 e morreu na cidade de Fossanova - Itália em 7 de março de 1274. Escreveu várias obras entre elas O Ente e a Essência, que será tratada em parte no presente artigo.
Serão permeados os âmbitos do conhecimento e da razão, como se consegue conhecer e qual seria o processo a ser seguido, respeitando o pensamento da Idade Média, pois para o Aquinate, sempre o homem estará em busca do que é universal, aquilo que envolve todo o universo.
Para que a razão do homem chegue a essa universidade, universal, tem que partir da realidade e quanto mais contato tem-se com aquilo que é sensível obterão se mais condições de chegar ao universal da razão.
A razão é imaterial, mas ela tem a capacidade de abstrair tudo que é material. O homem tem que optar por esse processo de querer chegar ao princípio de todas as coisas, pois como ser livre, pode escolher esse caminho.


1. A questão da Razão

Segundo o Dicionário Filosófico de Nicola Abbagnano, a Razão é a faculdade de raciocinar, apreender, compreender, ponderar, julgar, a inteligência que o homem usa para conduzir a uma indução ou dedução de algo. Por outra lado, a Razão Indução é o raciocínio que serve de indícios para chegar a uma causa; a Razão Dedução é inferência lógica de raciocínio e conclusão. (cf. ABBAGNANO, 2007).
Conforme o pensamento aristotélico, pode-se iniciar o percurso intelectivo que convida a pensar que o conhecimento indutivo passa para o conhecimento dedutivo; sendo assim, a passagem do mundo sensível que é composta para um mundo simples que é mais puro, sendo este a conclusão. (cf. AQUINO, 1981).
Contudo, no processo de Santo Tomás de Aquino existem alguns problemas a serem pensados nesse processo de conhecimento pela participação da razão no Ser.

2. O problema da Razão

Mesmo sabendo que a razão é imaterial, ela pode aprender das coisas materiais? Todavia, fica um questionamento sobre como pode-se saber se está aprendendo ou não? Será que se aprende somente pelo racional ou está-se partindo do mundo dado [sentido e emoções] para chegar ao mundo inteligível?

O conhecimento humano é tão dependente da realidade material que até mesmo o acesso ao conhecimento das realidades imateriais e transcendentes passam por ela, pois para conceituá-las a mente necessita das fantasias que são oferecidas pelo mundo sensível. (MINOSSO, 2013, p.13)

Segundo o pensamento aristotélico que fundamenta o pensamento de Tomás de Aquino, deve-se partir das coisas compostas [matéria e forma] para chegar às coisas simples que neste caso são Deus e os anjos. Para o conhecimento através da razão não é tão diferente, começa obter-se um bom conhecimento quando depara-se com as coisas sensíveis; segundo Sócrates, “não há nada na mente que não tenha passado pelo coração antes de ser abstraída por ela”.
O homem deve ficar atento ao seu redor para poder abstrair tudo e apreender o essencial das coisas para assim elevá-las ao seu intelecto. Embora, pode-se pensar um pouco na participação do conhecimento e da razão na obra do ente e a essência. Semelhante,

o intelecto humano não adquire imediatamente na primeira apreensão um conhecimento perfeito da coisa, mas primeiro apreende algo dela, por exemplo, a quididade da própria coisa, que é objeto primeiro próprio do intelecto; depois intelige as propriedades, os acidentes e as referências que acompanham a essência da coisa. De acordo com isso, tem necessidade de compor um apreendido com outro ou dividi-los e passar de uma composição ou divisão a outra, o que é raciocinar. (Apud, MINOSSO, 2013, p. 13)

A participação da razão no ser depende de um ente fora da razão para ser estimulada e com os problemas de falta de interesse de muitos, acarreta a não participação do todo da vida intelectual e fica só no imaginário e não passa para um ente concreto, com isso a participação fica prejudicada e não se tem uma abstração do real, ficando o homem em um mundo paralelo, onde o ente fictício tem uma participação maior.
Contudo, quando o homem não quer a participação no universal, ele vai deixar aos poucos de participar dos entes reais com o seu intelecto, ele não terá a compreensão da intimidade das coisas.

O nome intelecto é atribuído por conhecer o íntimo das coisas: pois entender é como que um ler dentro (intus legere). Ora, o sentido e a imaginação conhecem somente os acidentes exteriores; só o intelecto alcança o interior e a essência da coisa. (AQUINO Apud MINOSSO p.11)

Como se pode observar, o intelecto é de suma importância para chegar nas coisas primeiras, pois é através da sua capacidade de abstrair que o homem pode-se adentrar nesse universo do ser.

3. Razão e Conhecimento na obra O Ente e A Essência

Entende-se que existe um ente que vive fora da nossa razão (intelecto) e ele é muito importante para o desenvolvimento do que é essencial para o conhecimento do homem. O ente mesmo que, ao existir fora da razão, se tornar importante pelo simples fato de que existem outros entes e para um conhecimento visível é necessário o contato com esses outros. O ente que é fora da razão é chamado de real pelo motivo de ser uma realidade que podemos tocar e conhecer pelas causas –o ente considerado pela mente é dito razão–; nesse sentido a razão é o ato e a potência. O ato e a potência é no sentido que o conhecimento e razão poderão ser na transformação do intelecto humano [devir].

Neste sentido, a abstração significa o ato intelectual, por meio do qual o próprio intelecto torna inteligível o que ele considera e que existe fora da mente, de modo singular, sensível e individual. Assim sendo, a abstração é o modo com o qual o intelecto conhece. (MINOSSO, 2013, p. 10)

Na razão indutiva e dedutiva o homem esquece que muitas das coisas que estão na razão é abstração da mente, pois a hora é uma categoria transcendental, por isso ela existe, contudo não é algo concreto. Concretamente,

Ente de razão: um modo de pensar que serve para que as coisas conhecidas sejam mais facilmente retidas, explicadas ou imaginadas. Quer dizer que é tudo aquilo que somente existe dentro do nosso intelecto servindo de meio ou forma para nos situarmos no mundo real, por exemplo, as horas, dias ou anos, os números, as medidas, etc. (http://www.webartigos.com/artigos/o-ente-de-razao-e-o-ente-real-em-tomas-de-aquino/94192/)

Nesse contexto os entes fictícios a primeiro momento são mais fáceis de se entender, pois são coisas que a mente imagina e que não tem a menor intenção de existir [personagens]. Aristóteles em seu livro III De Anima, explica que não podemos inteligir algo sem recorrer as fantasias [personagens ou imagens], todavia sem a fantasia nada é possível ao inteligir.
O ente fictício não deve ser olvidado, pois ele é que nos ajuda a entender e compreender melhor a razão; porque é na razão que estão retidos os conhecimentos e sentidos (emoções) do que já o homem aprende ou sente com o decorrer da sua vida.

4. Razão e conhecimento em São Tomás de Aquino

Têm-se dois modos de adquirir o conhecimento que são sensível [captados pelos sentidos] e intelectivo [é conquistada pela razão]; por isso, o conhecimento sensível é o mais comum para a realidade. Como diz o filósofo conhecido como o boi mudo da Sicília “não se pode dizer que o conhecimento sensível é a causa total e perfeita do conhecimento intelectual, mas é antes de um certo modo, a matéria da causa” (AQUINO, 2010, p. 115), pois ele é a base que dá o contato direto com o real. Contudo, o conhecimento intelectual se dá a partir do contato com o que é sensível e ter-se-á que abstrair o essencial para obter o que é mais importante para a razão e o conhecimento em si.
O processo de abstração do que é concreto, ou seja, aquilo que se enxerga e se toca, seria o “real” e com Tomás a busca de concreto “real” seria até atingir o universal. Entretanto, existe a dualidade do ato e da potência que é o devir do conhecimento através da razão, pois a começar o contato com o concreto que é composto [matéria e forma] tentar-se-á chegar aquilo que é simples [Deus ou conhecimento puro]. Esse processo é fundamental para entender Aristóteles e o período da escolástica.
A razão [intelecto] não é mais algo que deva ser responsabilidade do professor, o homem tem o intelecto possível, pois é como uma tábula rasa, onde tudo pode ser escrito em ato. (MINOSSO, 2013). Mas, se comprometendo com sinceridade o conhecimento pela sua razão dedutiva, é certo falar que o conhecimento é construído pelo aluno [o conhecimento se dá através do esforço pessoal para querer chegar ao universal].
A noção do conhecimento é muito importante, pois cada ser humano tem em si o ato e a vontade de conhecer “as coisas” e que um particular universaliza o todo responsável por esse processo além da vontade é querer abstrair é aquisição da razão.

Conclusão

Pode-se enxergar no presente artigo como é de grande importância a participação da razão no processo de aprender e adquirir novos conhecimentos, pelo real até o universal.
Tem-se que tomar um pouco de cuidado, pois esse ato de conhecer pela razão não é tão simples assim, ele necessita de muito esforço pessoal e determinação para que isso aconteça, embora não se encontrem mais pessoas que tentam estimular esse processo nos jovens que estão sempre a questionar o mundo dado em busca da verdade, que é a substância simples.
O ente real mesmo existindo, (ele) existe fora de homem e é necessário que haja uma interação dos entes para que ele se torne concreto na razão. O homem é cominado a procurar a verdade, conhecê-la e comunicá-la aos demais, em qualquer âmbito no qual esteja inserido.
Para chegar uma boa busca do Ser e da participação do ente no Ser é necessário uma busca desse ente concreto que toda realidade da razão que já vem com o homem. O homem vai aperfeiçoar seu conhecimento universal através da realidade [ente real].

Referências

ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. Tradução, Ivone Castilho. 5ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007.

AQUINO, Tomás de. O ente e a essência. Introdução, tradução e notas de: MOURA, D. Odilão. Rio de Janeiro: ed. Presença, 1981.

NASCIMENTO, Carlos Arthur Ribeiro. Um mestre no ofício: Tomás de Aquino. São Paulo: Paulus, 2011. (Coleção como ler filosofia)

MINOSSO, Aline Herminia. Do Conhecimento à Verdade: O intelecto humano e a capacidade de inteligir a verdade no ente composto. 2013, 36 f. (Graduação em Filosofia) – Centro Universitário Salesiano de São Paulo, Lorena, 2013.


ZINGANO, Marco. Razão e sensação em Aristóteles: um ensaio sobre De Anima III, 4-5. Porto Alegre: L&PM editores, 1998. Coleção Philosophia





[1] Salesiano de Dom Bosco e aluno do segundo semestre do curso de Filosofia do Centro Universitário Salesiano de São Paulo (UNISAL) – Unidade Lorena.

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